Frutos de uma boa semeadura

A lei municipal que tornou obrigatório que 10% (dez por cento) da frota de ônibus de nossa cidade fosse equipada com elevador mecânico, para facilitar o acesso dos portadores de necessidades especiais, é de minha autoria. Ela foi proposta no ano de 96, e representou um grande avanço no exercício da cidadania, para esse segmento de nossa comunidade que representa em torno de 10% (dez por cento) dos cidadãos brasileiros.

Quando a lei foi sancionada, o Sindicato das Empresas de Transporte foi à justiça, por entender que a lei traria prejuízos às empresas que o integram, obtendo uma liminar que suspendeu a vigência da lei, por um longo período.
Só por volta do ano de 98, após intermediação do Ministério Público, que realizou audiências públicas para conciliar os interesses das partes mais interessadas – empresas e portadores de necessidades especiais – foi possível a lei ser colocada em prática.

De qualquer modo, considerando que a política é a arte do possível, no confronto de interesses que permeiam as relações econômico-sociais, já assegurávamos um grande avanço, com a anuência dos empresários ao efetivo cumprimento da lei. No entanto, o cumprimento do texto legal, no que toca ao percentual que ali ficou estabelecido, esteve sempre em descompasso com a determinação legislativa.

Em 2008, o vereador Abdon Murad conseguiu aprovar, na Câmara Municipal, um projeto que  alterou a lei que disciplina a matéria, ampliando para 15% (quinze por cento) o percentual de ônibus da frota que devem estar equipados com os elevadores mecânicos, previstos na lei original.
Hoje, os ônibus que possuem elevador mecânico, em nossa cidade, já são quase 230 (duzentos e trinta), numa frota de 900 (novecentos) veículos.

Considero que, apesar dos percalços, conseguimos dar um grande passo, no sentido de integrar os portadores de necessidades especiais ao nosso convívio social, permitindo-lhes uma vida mais participativa, em suas relações interpessoais; mais intensa, em seus sentimentos espirituais; mais íntegra e plena, enquanto cidadãos, no exercício assegurado de seus direitos de cidadania.

Quem anda, no dia a dia, em nossa cidade, tão bela em sua história; tão exuberante, em suas riquezas naturais; tão expressiva, em sua arquitetura; tão acolhedora, na fidalguia de seus filhos que a habitam; quem anda, por nossas ruas, é levado a pensar que não temos portadores de necessidades especiais, por aqui. Ledo engano. Eles estão em casa, guardados, inibidos, cerceados, em aspectos essenciais de suas vidas, por que nossa cidade não está devidamente preparada para acolhê-los como cidadãos, com suas imanências e com seus anseios.

Nossas ruas não possuem nenhum tipo de equipamento urbano, que contemple a necessidade desses cidadãos brasileiros, irmãos nossos de origem e de destino, que precisam exercer a parcela de suas vidas, de uma forma menos hostil, de uma forma mais socialmente justa, do ponto de vista de suas necessidades.

Raríssimas rampas nas calçadas. Nenhum lugar reservado para embarque e desembarque. Raros telefones públicos sinalizados. Nenhuma consideração para com o esse público especial, que representa uma parcela desconhecida de nossa população, mas, certamente, considerável em seu contingente quantitativo também.

O mesmo acontece com os edifícios públicos: hospitais, escolas, creches, repartições. Quase nada exibe essa preocupação do poder público. Do mesmo modo, são as edificações privadas. Precisamos realizar conquistas, precisamos avançar em busca dos ideais, dos sonhos, em busca do futuro, contemplando as esperanças que podem nos conduzir à construção de um nível de felicidade, de satisfação com a vida, de forma mais fraterna e participativa.

Os portadores de necessidades especiais se inserem, em nossas  preocupações,  por estarem precisando de nós, de nossas ações, de nossos gestos responsáveis. Ninguém nasce ou se torna especial, nesse sentido,  porque desejou ser. Tudo é imponderável, destino, casualidade, mistério, na vida. Mas somos todos irmãos. Somos todos responsáveis pelo nível de vida, de satisfação, de todos os nossos semelhantes.

O fato de não estar no exercício do mandato de vereador, função que exerci por três mandatos seguidos, me tolhe um pouco as ações e as aparições na mídia, para debater temas como este, da maior importância para nossa cidade, para o nosso país.
As matérias que a Globo fez veicular, semana passada, foram muito oportunas e esclarecedoras, revelado a dramática situação dos portadores de necessidades especiais, nas capitais do país. Tais matérias me ensejaram voltar a abordar esse tema, com a consciência de quem participou e continua perquirindo, refletindo, revelando e propondo mudanças para que tenhamos uma cidade mais humanizada.

Roseana, em seu atual programa de Governo, está prevendo uma política específica para os portadores de necessidades especiais, valorizando-os como cidadãos, assegurando-lhes acesso aos cargos públicos, dando-lhes condições de conviver e construir suas esperanças, sob a égide de um governo sensível, humanitário, leal e justo, como cidadãos produtivos e responsáveis.
 
Para esse tipo de trabalho, mais que em muitos outros, é preciso dedicação e amor. Estamos dando nossa parcela. Amar a cidade é ser solidário com nossos semelhantes.
ivansarney@uol.com.br

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