Uma prece, um lamento de despedida

 

evandro_sarneyUma prece, um lamento de despedida. Um irmão, um escritor, um poeta, que nos deixa, depois de muito tempo em silêncio.

Um silêncio que a vida lhe impôs, contrapondo-se à sua farta eloquência, ao seu gosto de viver e desfrutar de sua existência, de forma simples, ética, honesta, humilde, sem qualquer contágio sombrio na alma e nos passos que deu.

Um político vibrante, mordaz nos discursos de confronto; astuto e hábil, nas ações de construir convergências, tão necessárias aos grandes políticos.
Um bem humorado jeito de encarar os dissabores da vida, e de fazer gracejos com tais desventuras, encorajando a si, a seus familiares e amigos.

Um irmão que viveu para o amor que alimentou na alma e partilhou com esposa, filhos, netos, poesia; amor que lhe deu condições de longevidade, aliada à sua genética materna. Uma alma pura e bela.

Frequentava muito a nossa casa, com meu pai vivo, e depois de sua partida. Ficava, horas a fio, conversando conosco, pedia conselhos a minha mãe, e ria das situações que a vida lhe apresentava. Por tudo isso, conquistou o coração de todos nós, seus irmãos paternos. Era carinhoso e afetivo, achando sempre uma palavra de elogio e otimismo para cada um.

Excelente declamador, gostava de declamar, com toda a sua verve dramática, o poema de Luiz Guimarães, “A história de um cão”: “Eu tive um cão. Chamava-se veludo/Magro, asqueroso, revoltante, imundo/Para dizer numa palavra, tudo/Foi o mais feio cão que houve no mundo…” E prosseguia até o comovente final, fazendo correr lágrimas em nossas faces. Eu gostava de ouvir esse poema e o decorei, de tanto ouvi-lo, nas manhãs em que visitava nossa família.

Outro comovente poema, que gostava de declamar, era um soneto do poeta Armando Vieira da Silva: “Era uma vez, uma cigana. Um dia/Laura pediu-lhe que lhe lesse a sina/E ela, a cigana, de contente ria/Ante a mãozinha delicada e fina…” A esse belo e trágico soneto, ele emprestava sua voz grave e sonora, e nos levava, sempre, às lágrimas, terminando os versos visivelmente comovido, como todos nós.

A Academia Maranhense de Letras, onde éramos três irmãos, como confrades, perde um de nós, um dos seus membros, tendo cultivado o gosto de frequentá-la, enquanto pode. Descanse em paz, meu irmão, poeta e confrade Evando Sarney.


Um abraço carinhoso e comovido nos sobrinhos: Roberto, Concy, Tânia, Vandinho, Ana Luzia, Sarney Neto e em seus filhos.

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