Reabilitando centros urbanos

CadeiranteO direito de ir e vir é uma das garantias essenciais do cidadão, elencadas em nosso texto constitucional, no capítulo dedicado aos “direitos e garantias individuais e coletivos”. Tal garantia constitui uma das premissas do estado democrático de direito que, por sua vez, fundamenta-se no poder que emana do povo. A democracia é o regime de governo exercido pelo povo. A própria etimologia da palavra nos fornece essa conceituação, nos radicais gregos que a compõem: demo=povo, cracia=governo.

A cada dia que passa, as cidades estão abrigando um número maior de cidadãos, quer pelo aumento da taxa de natalidade social, quer pela migração interna. Essa migração envolve estados e municípios, sendo as capitais e os grandes centros urbanos, os que exercem maior poder de atração desses migrantes, na maioria das vezes, egressos de zonas rurais.

As cidades, em especial as capitais, estão cada vez mais demandadas por pessoas, em busca de seus espaços públicos: ruas, avenidas, praças, edifícios, equipamentos de laser, centros comerciais, shoppings, na busca interminável do homem, por satisfazer suas necessidades sociais.

Tudo isso torna extremamente difícil a vida de um grande contingente de cidadãos, nossos irmãos de espécie, quem têm, muitas vezes, que permanecerem reclusos em suas residências, pelas dificuldades de acesso a locais singelos como cinemas, escolas, teatro, restaurantes, igrejas, e a toda uma gama de espaços de necessidades habituais para um cidadão comum, sem restrições locomotoras. Refiro-me aos portadores de necessidades especiais; aos paraplégicos ou tetraplégicos, em geral, um cadeirante.

Quem anda, no dia a dia, em nossa cidade, tão bela em sua história; tão exuberante em suas riquezas naturais; tão expressiva em sua arquitetura; tão acolhedora, na fidalguia de seus filhos que a habitam; quem anda, por nossas ruas, é levado a pensar que não temos portadores de necessidades especiais, por aqui. Ledo engano. Semelhante ao que acontece na maior parte das cidades, em nosso país, eles estão em casa, guardados, inibidos, cerceados, em aspectos essenciais de suas vidas, porque essas cidades não estão preparadas para acolhê-los como cidadãos, como seres humanos, com suas imanências e com seus anseios.

Nossas ruas quase não possuem equipamentos urbanos, que contemplem a necessidade desses cidadãos brasileiros, irmãos nossos de espécie viva, irmãos de origem e de destino, que precisam exercer a parcela de suas vidas, de uma forma mais participativa, de uma forma mais socialmente justa, do ponto de vista de suas necessidades.

Raríssimas são as calçadas com rampas e os lugares reservados para embarque e desembarque de cadeirantes. Raríssimos também são os telefones públicos sinalizados; as informações em braile para os deficientes visuais. Do mesmo modo, inexistem semáforos sonoros, para atender aos deficientes visuais. Essas pessoas representam uma parcela desconhecida de nossa população, mas certamente considerável em seu contingente  quantitativo também.

O mesmo acontece com os edifícios públicos: hospitais, escolas, creches, repartições. Nada exibe essa preocupação do poder público. Nada, absolutamente, nada. Do mesmo modo, as edificações privadas, que acolhem grande número de pessoas e que representam lazer, divertimentos, serviços, como os shoppings, também não estão preparadas para acolher portadores de necessidades especiais e suas necessidades de convívio.

Sou o autor da lei municipal que determinou que 10% da frota de ônibus de nossa cidade seja equipada com elevador mecânico para acesso rápido e fácil aos portadores de necessidades especiais. Os ônibus equipados com elevadores mecânicos oferecem maior comodidade aos portadores de necessidades especiais, especialmente àqueles que são paraplégicos, tetraplégicos, deficiente visuais e outros, que têm dificuldades locomotoras e que precisam de auxílio, para que possam exercer uma considerável parcela de suas vidas. Já estão circulando esses ônibus, mas ainda não atingimos o percentual determinado pela lei.

Precisamos realizar conquistas, avançando em busca dos ideais, dos sonhos, em busca do futuro, contemplando as esperanças que podem nos conduzir à construção de um nível de felicidade, de satisfação com a vida, de forma mais fraterna e participativa. Os que têm a responsabilidade de conduzir, de orientar, de apontar os rumos para onde deverão seguir nossos destinos de povo, não podem abdicar desse direito, nem fugir dessas responsabilidades.

Os portadores de necessidades especiais se inserem em nossas  preocupações por serem cidadãos como nós, e, de uma forma especial, por estarem precisando de nós, de nossas ações, de nossos gestos responsáveis. Ninguém é portador de necessidade especial porque desejou ser. Tudo é imponderável, destino, casualidade, mistério. Mas somos todos irmãos. Somos todos responsáveis pelo nível de vida, de satisfação, de todos os nossos semelhantes.

Muitos já estão de mãos dadas, construindo com seu trabalho, dias melhores para esses cidadãos que precisam de nós. Para esse tipo de trabalho, mais que em muitos outros, é preciso dedicação e amor. Estamos dando a nossa parcela. Mesmo sem mandato, continuarei lutando por essas causas de relevantes e difusos interesses sociais. Amar a cidade é promover ações de inclusão para os portadores de necessidades especiais. É preciso amar a cidade.

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