O Burro
Mal desponta a manhã, inda a relva orvalhada
Estendendo a secar à luz do sol nascente,
E tu, vivaz jerico, a trote pela estrada,
Vais agitando lesto a cauda, alegremente.
Bem curto é o teu repouso e já nova jornada
Com dobrado vigor, enfrentas, resistente.
Vão-se as léguas ficando atrás, na caminhada
Que ao porto te conduz, servindo ingrata gente.
Ri-se o homem de ti, vibrando-te o chicote
Sem, contudo, pensar no pérfido calote
Que, sorrindo, lhe passa a corte incompreendida.
Homem, nada mais és do destino um burro
Arrastando cansado, aos trambulhões e a murro
A carroça pesada e exótica da vida.
Soneto de Vicente Maia
(Poeta maranhense, professor do Liceu Maranhense)